Brasil: Pátria Amada?
“Brasil, ame-o ou deixe-o” foi um dos slogans mais famosos do período militar no país. O regime se foi, mas o espírito da coisa ficou. Só que agora, com novos contornos. Hoje, presente especialmente entre os jovens, essa é uma discussão que foca muito mais na questão da qualidade de vida do que no patriotismo em si.
Desde a virada do século, a população brasileira aumentou em cerca de 40 milhões de pessoas, um número consideravelmente maior do que a população do Canadá. Ou seja, em pouco mais de 20 anos vieram ao mundo brasileiros suficientes para povoar um outro país.
A princípio, ser um desses brasileiros e nascer em um país tropical, cheio de riquezas e belezas naturais, com uma cultura extremamente diversificada e um povo simpático por natureza, só pode ser um imenso golpe de sorte. Afinal, o que poderia dar errado?
Mas a verdade é que, para muitos brasileiros, o Brasil já não é mais um sonho intenso, muito menos um raio vívido de amor e esperança. Desemprego, pobreza, violência e ineficiência da máquina pública são só alguns dos vários motivos que tem levado parte da população a se sentir extremamente insatisfeita com o país.
Diante disso, muitos têm buscado no exterior a esperança de uma vida melhor. Mesmo com as restrições de viagem, decorrência da pior pandemia que já enfrentamos na história, mais de 130 mil brasileiros já deixaram o país para tentar a vida lá fora só no ano de 2022. Muitos desses são profissionais qualificados em busca de países que ofereçam oportunidades de trabalho mais justas e vantajosas.
Esse fenômeno se tornou tão recorrente que ganhou nome e sobrenome. É a famosa fuga de cérebros. Mas quais são os grandes problemas do Brasil? Qual é o destino de quem vai? E será mesmo que não temos solução? É exatamente o que vamos descobrir mais a frente.
Falta de oportunidade
Pesquisas indicam que até 74% dos brasileiros estão insatisfeitos com o rumo do país nos últimos tempos e mais de 70% acredita que a sociedade brasileira esteja falida. De acordo com a fundação Getúlio Vargas, quase metade dos jovens entre 15 e 29 anos querem deixar o país. A fuga de cérebros dificulta o desenvolvimento do país. Que perde mão-de-obra qualificada, como é o caso do Brasil. Uma das razões por trás desse fenômeno é a falta de oportunidade, uma das características mais marcantes do nosso país.
Se você já tentou arranjar um emprego minimamente justo, abrir um negócio e focar em um projeto de pesquisa ou até mesmo comprar algum tipo de tecnologia de última geração, você provavelmente sabe do que eu estou falando. Pouca oferta de emprego, muita burocracia, falta de incentivo à educação, além de custos altíssimos e quase sempre desproporcionais por itens que lá fora quase sempre são considerados básicos, como um carro, acabam minando as possibilidades de crescimento profissional e pessoal da maioria dos brasileiros.
Em um estudo de 368 páginas, o banco mundial concluiu que a burocracia no país trava o crescimento dos negócios. Para se ter uma ideia, o desempenho do ambiente de negócios brasileiro ficou abaixo da média dos países membros da OCDE, dos países latino-americanos e até mesmo dos outros membros do BRICS.
O banco mundial estima que é necessário cerca de 4 dias para se abrir uma empresa nos Estados Unidos. No Brasil, esse tempo salta para 17 dias, dada a natureza muito mais burocrática dos negócios por aqui. E como todo mundo já deve saber, o Brasil é conhecido por ter uma das maiores cargas tributárias do mundo, além de uma série de burocracias legais apelidada de Custo Brasil. Isso acaba afetando todo o meio empresarial, especialmente aquelas empresas que ainda estão tentando se estabelecer no mercado.
Em 2019, a Confederação Nacional das Indústrias fez um levantamento a respeito da tributação sobre a renda das empresas. O Brasil ficou em último lugar no ranking, com o pior índice entre os 18 países concorrentes diretos no Mercado Internacional. Esse mesmo estudo ainda demonstrou que o total de impostos e contribuições recolhidas pelas empresas representa o valor de 65% do lucro dos negócios. No Canadá, esse percentual é de 20,5%, menos de 1/3.
Todo esse enorme peso nas costas das empresas acaba diminuindo drasticamente sua capacidade de investimento, o que atrapalha o desenvolvimento do negócio e afasta possíveis investidores estrangeiros, que, neste caso, preferem investir em outros países a custos menores e retornos maiores.
Como consequência de todo esse ambiente desfavorável, uma grande parcela da economia sofre. Especialmente porque as empresas são as principais fontes de emprego em uma sociedade. Por isso não é nada bom para a saúde de um estado quando elas não vão bem.
Como a criação de novas empresas no Brasil não é algo muito atrativo e as que já existem têm seu crescimento sufocado por uma cadeia interminável de impostos, a criação de novos postos de trabalho fica comprometida e quase sempre é reduzida, fazendo com que o número de vagas de trabalho diminua.
Dados do IBGE apontam que, em 2021, são mais de 14 milhões de desempregados no país, sendo a maior parte desse número composto por jovens. Eles são uma parcela particularmente vulnerável ao desemprego, porque normalmente ainda estão tentando adquirir algum tipo de qualificação. E por isso mesmo não possuem experiência. Isso gera um ciclo vicioso onde as empresas buscam profissionais experientes e por isso, os profissionais que estão entrando no mercado não conseguem experiência. Com isso, a busca por um profissional ou por um emprego acaba sendo extremamente ineficaz.
O mercado de trabalho é uma das bases que sustentam a economia. Se ele vai mal, significa que a economia está, de certa forma, enfraquecida. É um cenário onde a força de trabalho é subutilizada, fazendo com que haja um desperdício de capital humano e financeiro.
Mas é importante ressaltar que um dos fatores que contribuem para o alto índice de desemprego é a falta de qualificação adequada para ocupar os cargos disponíveis. E acreditem, esse dado não se refere só ao ensino superior e técnico, mas sim, ao ensino básico.
Em 2019, 60% das vagas ofertadas por mutirões de contratação de grandes empresas não foram preenchidas por falta de qualificação. Entre os principais motivos estavam: dificuldade de se expressar, deficiência em matemática, dificuldade com informática e falta de inglês. Mais um dos reflexos da falta de oportunidade no Brasil, dessa vez em relação à educação, que dificulta até mesmo a qualificação para postos de trabalho que não exigem grande complexidade.
Mas mesmo aqueles que estão empregados também sofrem com a pesada mão do estado. Isso porque o Brasil está entre os países que mais cobram imposto sobre consumo, considerado a forma mais perversa de tributar a população. É bem comum as pessoas não verem o tamanho do imposto que pagam ou até acreditarem que não pagam nada. Por serem isentas ou se declararem como tal, é aí que mora o perigo, pois o imposto sobre o consumo está em tudo o que você compra, que praticamente dobra a sua conta de supermercado. Representa quase 50% da sua conta de energia, e com a gasolina, de 7 reais, quase 3 reais vão para o governo.
Esse imposto é considerado o mais perverso de todos porque, ao contrário do imposto sobre a renda, que paga mais quem ganha mais, o imposto sobre o consumo não se importa com quanto você ganha. Logo, quem sai mais prejudicado é justamente o que ganha menos. O resultado disso, para muitas famílias, é ter que escolher o dia que vai poder comprar carne de gado trocando pelo frango ou pelo ovo. É transformar um simples jantar fora em uma ida ao restaurante em um evento do mês.
Segundo matéria da InfoMoney, quase metade de todo o imposto arrecadado no Brasil vem do consumo, ou seja, ele equivale a praticamente todos os outros impostos somados. Isso, por si só, já seriam obstáculos suficientes. Mas ainda nem falamos do maior dos problemas: Para onde vai todo esse imposto?
Corrupção
Há muitos anos se escuta falar do potencial do Brasil. Ele chegou até mesmo a ser considerado por alguns como uma possível nova potência mundial. Membro do BRICS, grupo de países em desenvolvimento composto por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul e outros. Potencial, definitivamente, não é o que falta. O problema é que esse potencial nunca foi convertido em progresso. Pelo contrário, foi quase que completamente jogado na lata do lixo. Isso especialmente porque o país enfrenta altos níveis de corrupção nos mais variados escalões.
Ao contrário dos brasileiros aos quais nos referimos anteriormente, existem alguns repletos de oportunidades e que não hesitam em aproveitar ao máximo. O único problema é que essas oportunidades não são de trabalhar ou estudar, mas de passar a perna nos outros. São alguns políticos, empresários, funcionários públicos, agentes da lei, juízes e até membros das instituições religiosas que, diga-se de passagem, não pagam uma série de impostos.
A corrupção está enraizada na sociedade brasileira. Suas origens são mais antigas do que se imagina. E remontam ao nosso passado, herança dos tempos coloniais. A corrupção por aqui é histórica. O nosso modelo de colonização teve fortes características de patrimonialismo e clientelismo.
O patrimonialismo é ausência de distinção entre domínio público e privado. Ou seja, não existe essa ideia de que o dinheiro é do povo e deve ser usado para o povo. Já o clientelismo era o ato de distribuir empregos, favores ou bens em troca de apoio político, o famoso suborno.
Quando o Brasil foi colonizado, a coroa portuguesa teve dificuldade em encontrar voluntários para se aventurar na nova terra. Para tentar resolver esse problema, eles passaram a conceder cargos àqueles que concordassem vir para cá. Essas concessões resultavam em grande prestígio social e vantagem financeira. Por isso, não demorou muito até que essas concessões passassem a ser usadas para beneficiar familiares e amigos. Durante esse período, o pagamento de propina a membros do governo era regulamentada por lei, o que quer dizer que essas práticas já eram comuns por aqui antes mesmo do Brasil ser o Brasil.
Ano após ano, o Brasil segue tendo um péssimo desempenho no ranking mundial de corrupção. Da ONG transparência Internacional, essa avaliação, que atribui notas de 0 a 100, onde zero representa um país altamente corrupto e cem representa um país livre de corrupção. O Brasil obteve 38 pontos em 2020, a mesma pontuação obtida por países como Etiópia, Cazaquistão, Suriname e Tanzânia.
Os valores movimentados em esquemas de corrupção no Brasil são astronomicamente altos. Estimativas indicam que o país perde cerca de 200 bilhões de reais em esquemas de corrupção todo ano.
Para se ter uma noção de como esses valores são tão altos, saiba que se você ganhasse 5 mil reais por dia desde que Cabral desembarcou no Brasil, em 1500, você ainda não teria nem 1 bilhão de reais. Imagine agora 200 bilhões todo ano. Isso explica o porquê de sempre que esquemas de corrupção são desmantelados, o patrimônio dos criminosos envolve carros esportivos de luxo, mansões dignas de Hollywood, joias extremamente valiosas, helicópteros e jatinhos particulares.
A questão é que todo esse dinheiro é público. Ele sai do meu bolso e do seu todos os dias, quando pagamos todo tipo de taxa e imposto, seja direto ou indireto. Enquanto isso, o trabalhador brasileiro acorda cedo para trabalhar em exaustivos turnos só para conseguir colocar comida para dentro de casa. Se ele tiver sorte, consegue financiar um Gol 1.0 para pagar em 60 meses, comprometendo 5 anos do seu orçamento.
Um estudo recente da Universidade de Brasília apontou que a corrupção já preocupa mais os brasileiros do que a saúde ou o meio ambiente. Um país nada mais é do que a soma de seus cidadãos. Nesse caso, o Brasil sou eu e você. Se estamos de fato preocupados com a corrupção, então por que continuamos sendo um país tão corrupto? Porque crimes de corrupção não são tratados como um crime a nação como deveriam? Porque a mesma máquina que dá poder para esse tipo de criminoso é quem julga se ele é culpado ou não.
Enquanto isso, eles criam narrativas para dizer que a corrupção é da cultura do brasileiro. Que você, que estacionou em vaga para deficiente no mercado em uma terça-feira chuvosa, é tão sujo quanto eles, que desviam dinheiro do povo, fazem parcerias com traficantes, dão cargos para familiares e aumentam seus próprios salários. E o resultado disso são cada vez mais jovens, o futuro do Brasil, procurando fora daqui uma vida mais justa. Mas para onde eles estão indo? E será que não temos solução?
Um grande abraço e até mais?
Dentre os destinos preferidos, em primeiro está Portugal, seguido do Canadá, conforme levantamento global da consultoria BCG, de 2020, é a primeira vez que os Estados Unidos não liderou o ranking e sequer entrou no top 3.
Embora o saldo esteja na casa de 130 mil pessoas que saíram daqui no ano de 2022, a verdade é que foram quase 450 mil que de fato entraram em um avião para não voltar mais. Mas pouco mais de 300 mil pessoas foram mandadas de volta por causa das medidas restritivas da pandemia. Em sua maioria, são pessoas de classe média que não tem oportunidade.
Mas os problemas do Brasil tem solução e muitas oportunidades, se você souber procurar. Se pudéssemos resumir em uma palavra, a solução seria essa: tecnologia. O tempo onde as coisas acontecem por baixo dos panos e ninguém fica sabendo está terminando. Os problemas latentes do Brasil estão cada vez mais visíveis e o poder do cidadão cada vez maior.
Segundo matéria do InfoMoney, o economista e ex-presidente do banco central Armínio Fraga aponta que o grande problema são os gastos do governo, 80% dos gastos públicos no Brasil vão para a previdência e para o funcionalismo. Em outros países, esse valor é menor que 60%.
A pandemia de COVID-19 colocou ainda mais em evidência as falhas administrativas do país e a sociedade tem cobrado mais. Ao mesmo tempo, são pessoas como eu e você, que temos a oportunidade de fazer parte da mudança. É isso. Um grande abraço.
Fonte: Elementar
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